Malhando
em ferro frio
“ Se
bem me lembro “,
desde sempre, chamei a atenção para a necessidade de sermos
criteriosos e responsáveis na utilização dos dinheiros públicos,
utilizando-os com a máxima racionalidade, sendo certo que tal não é
possível sem um conhecimento aprofundado das necessidades da Região
e da forma como lhes dar resposta.
Vem
isto a propósito da Resolução nº. 9/2014 aprovada em Conselho do
Governo no passado dia 20 de Janeiro que, alterando o contrato de
gestão de serviços de interesse económico geral relativo à
construção e exploração de navios de transporte de veículos e
passageiros entre as ilhas do arquipélago dos Açores, autoriza a
empresa pública Atlânticoline a avançar com um concurso público
internacional para a construção de dois navios com capacidade para
650 passageiros e 150 viaturas e cujo custo global rondará os 85
milhões de euros.
Como
é sabido, a Região não necessita, nunca necessitou e nunca
necessitará de dois Ferrys
de médio porte. Torna-se embaraçoso referir as taxas de ocupação
desses dois navios ao longo destes anos em que a operação decorreu.
Convém no entanto referir que, considerando os 9 meses de operação
– 6 meses de um navio e 3 do outro – e as respetivas escalas, o
total de lugares disponibilizados ultrapassa os 2 milhões para um
total de passageiros transportados que não ultrapassa os 50 mil ou
seja 2,5% de taxa de ocupação. Acresce, é público e publicado,
que a faturação da Atlânticoline não chegou para pagar o
combustível. Pode-se pois concluir que com tal misera taxa de
ocupação o custo passageiro/milha será, muito provavelmente, o
mais caro do mundo.
É
pois, do meu ponto de vista, absolutamente incompreensível que se
avance para a construção de dois novos navios, com as
características atrás referidas sem, tendo por base níveis de
serviço adequados, definir o modelo a implementar, cumprindo a
máxima do Governo; “ ajustar
a oferta à procura
“. O
resultado era suposto ser um modelo funcionando verdadeiramente
articulado, com mais escalas, mas sem duplicações e oferta
excessiva e inútil. Importa não esquecer que tudo o que é
excessivo e inútil se traduz em custos também eles excessivos e
inúteis.
A
Região só deve possuir os meios próprios de transporte que
necessita para dar resposta às suas necessidades permanentes. Apesar
dos elevados custos de exploração praticam-se, e bem, no transporte
regular regional de passageiros, utilizando a via marítima, tarifas
sociais subsidiados. É nesse contexto – resposta subsidiada às
necessidades permanentes – que surgem, e bem, os dois novos navios
para substituir os Cruzeiros.
Não
é contudo para dar resposta a necessidades permanentes que surgirão
os dois navios referidos na Resolução. Não será também com a
respetiva faturação que se fará face aos custos em jogo. Teremos
assim um “modelo” profundamente desajustado, pago por todos nós
e mais grave do que tudo isto é o facto de daí não advir nenhuma
mais-valia para a Região porque, na dimensão proposta, como atrás
se viu, dele não necessitamos.
A
título de exemplo refira-se que um navio porta-contentores
inter-ilhas, com mais ou menos as mesmas dimensões, pese embora
tenha uma faturação anual próxima dos 6 milhões de euros,
apresenta um défice anual entre 4,8 e 5 milhões de euros.
Qual
o défice anual que apresentarão estes dois navios? Reconheço que,
infelizmente, a pergunta parece ser irrelevante. Serão sempre os
mesmos a, direta ou indiretamente, pagar.